No grande salão da casa de Verão dos Pereira, a luz entrava pelas janelas abertas de lado a lado. Por toda a sala pairava um ligeiro cheiro a maçã. O clima era de tranquilidade e a senhora Pereira sentava-se na sua cadeira de baloiço a ler um livro particularmente grande. Não era a sua leitura habitual. Na casa dos cinquenta, Camila Pereira exibia sinais de velhice na sua cara marcada pelas rugas. O seu cabelo, grisalho, era cortado curto. Camila tinha recentemente recuperado de um cancro que lhe tinha levado o útero por completo. Devido a este problema de saúde, Camila não saiu de casa durante vários anos. Viúva rica, contratou uma equipa médica privada que tratava dela na sua própria casa, fazendo, contudo algumas visitas regulares ao Hospital dos Lusíadas.
Quando saía de casa ostentava sempre jóias de luxo. Da última vez que fora ao hospital, viu-se forçada a sair do carro ao pé da paragem de autocarros, porque não havia estacionamento livre no parque do hospital. O motorista dela iria buscá-la mais tarde. O caminho a pé até ao hospital foi penoso para a viúva com um chapéu grande a cobrir-lhe a cabeça. Nesta altura já estava praticamente livre do cancro, sendo que esta era mais uma consulta de rotina e prevenção. No entanto, Camila não conseguiu prevenir-se de ter a sua morte agendada nesse dia.
Contudo, o assassino não conseguiu pôr o seu plano em prática, tendo que esperar pacientemente por uma boa oportunidade, infiltrando-se na enorme mansão da mulher como criado dela. Estava agora dentro do jardim, onde os citrinos cresciam em abundância. O cheiro agradava-lhe, parando para apreciar as esplendorosas árvores de fruto. O assassino foi então abordado por um homem, o jardineiro: "É a sua primeira vez aqui? Precisa de ajuda?". O assassino não gostou do modo como o homem o abordou, respondendo com um seco não.
A tempestade viria daqui a pouco, precisava apressar-se ou não conseguiria fugir dali com a chuva. Já dentro da sala, o relógio marcava as dezoito horas. Camila pediu um copo de vinho ao seu novo empregado. E um copo de vinho a Camila teve.
Camila foi encontrada pela sua filha que estava de visita na sua cadeira de baloiço no grande salão da casa de férias enquanto a luz da Lua brilhava sobre o seu pálido cadáver.
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